quarta-feira, 28 de maio de 2008

A depuração da palavra


Vê como o verão


Vê como o verão
subitamente
se faz água no teu peito,

e a noite se faz barco,

e minha mão marinheiro.


Eugénio

segunda-feira, 26 de maio de 2008

The Rave Edgar Allan Poe- O corvo Fernando Pessoa

The Raven

Once upon a midnight dreary, while I pondered weak and weary,
Over many a quaint and curious volume of forgotten lore,
While I nodded, nearly napping, suddenly there came a tapping,
As of some one gently rapping, rapping at my chamber door.
`'Tis some visitor,' I muttered, `tapping at my chamber door -
Only this, and nothing more.'

Ah, distinctly I remember it was in the bleak December,
And each separate dying ember wrought its ghost upon the floor.
Eagerly I wished the morrow; - vainly I had sought to borrow
From my books surcease of sorrow - sorrow for the lost Lenore -
For the rare and radiant maiden whom the angels named Lenore -
Nameless here for evermore.

And the silken sad uncertain rustling of each purple curtain
Thrilled me - filled me with fantastic terrors never felt before;
So that now, to still the beating of my heart, I stood repeating
`'Tis some visitor entreating entrance at my chamber door -
Some late visitor entreating entrance at my chamber door; -
This it is, and nothing more,'

(...)

O Corvo

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de algúem que batia levemente a meus umbrais.
“Uma visita”, eu me disse, “está batendo a meus umbrais.
É só isto, e nada mais.”

Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu’ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P’ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais -
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!

Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
“É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isto, e nada mais”.

(...)

domingo, 25 de maio de 2008

Meu pé de laranja lima - José Mauro de Vasconcelos

-Primeiro, se nós somos dois grandes amigos, como é que eu tenho de chamar senhor pra lá, senhor prá cá..Ele riu.
- Pois me trata como quiseres. Por você.Por tu...
-Tu, não, é muito dificil; sou capaz de repetir todas as nossas conversas para Minguinho. Mas quando vou eu falar de tu, não acerto. Melhor você. Não ficou zangado?
- Ora! Por quê? É um pedido muito justo até. Quem é esse Minguinho que eu nuca ouvi falar?
- Minguinho é Xururuca.
-Bem, Xururuca é Minguinho e Minguinho é Xururuca. Fiquei na mesma.
-Minguinho é o meu pé de Laranja Lima. Quando eu quero muito bem a ele eu chamo de Xururuca..
- Então possuis um pé de Laranja Lima que se chama Minguinho.
- E ele é um danado. Ele fala comigo, vira cavalo, sai com a gente. Com Buck Jones, com Tom Mix...Co Fred Thompson... Você.. (os primeiros vocês foram duros de dizer, mas eu tinha decidido...)Você gosta de Ken Maynard?
Ele fez um gesto de desentendido sobre cowboy de cinema.
-Outro dia Fred Thompson me apresentou a ele. Gostei muito do chapelão de couro que ele usa. Mas ele parece que não sabe rir...
-Vamos embora, que estou ficando tonto com esse mundo que existe na tua cabecinha. E a outra coisa?

Manifesto Anti-Dantas

Basta pum basta!!!
Uma geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um coio d'indigentes, d'indignos e de cegos! É uma resma de charlatães e de vendidos, e só pode parir abaixo de zero!
Abaixo a geração!
Morra o Dantas, morra! Pim!
Uma geração com um Dantas a cavalo é um burro impotente!
Uma geração com um Dantas ao leme é uma canoa em seco!
O Dantas é um cigano!
O Dantas é meio cigano!
O Dantas saberá gramática, saberá sintaxe, saberá medicina, saberá fazer ceias pra cardeais, saberá tudo menos escrever que é a única coisa que ele faz!
O Dantas pesca tanto de poesia que até faz sonetos com ligas de duquesas!
O Dantas é um habilidoso!
O Dantas veste-se mal!
O Dantas usa ceroulas de malha!
O Dantas especula e inocula os concubinos!
O Dantas é Dantas!
O Dantas é Júlio!
Morra o Dantas, morra! Pim!
[...]

Almada Negreiros